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Tadinha da minha Acácia!

  • murdochwilliam28
  • Sep 5
  • 3 min read

Minha linda árvore, minha acácia,

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que eu pensava que viveria mais do que eu, morreu.Morreu não pela força natural do tempo, mas pela incúria da Prefeitura, que, em sua omissão, não retirou a tempo as parasitas que infestavam seus galhos. Parasitas que se espalham sorrateiramente, como hoje também infestam o governo, corroendo, sugando, deformando o que antes era belo e saudável.


Eu a vi nascer. Eu estava lá quando foi plantada, pequenina, frágil, quase imperceptível diante da imensidão do céu. Com o passar do tempo, vi-a crescer, firme, reta, elegante. Uma acácia linda, esguia e altaneira. Ainda lembro a alegria de perceber que, a cada primavera, ela se vestia de verde novo, como se fosse um vestido de festa, delicado e ao mesmo tempo majestoso.

Eu a adubei por meses, reguei, cuidei dela como quem cuida de um filho ou de um amigo próximo. O resultado foi maravilhoso: a árvore tornou-se a mais alta da rua, alcançando a altura de quase quatro andares. Todos que passavam reparavam nela. Era um marco, um símbolo, uma espécie de guardiã silenciosa do nosso pedaço de chão.


Mas um inimigo silencioso se aproximou. As ervas-de-passarinho começaram a tomar conta de seus galhos. À primeira vista, pareciam inofensivas, até bonitas, mas logo percebi que eram vampiros vegetais, sugadores da vida. Fiz inúmeras solicitações, pedi ajuda às autoridades, mas nada foi feito. A árvore foi definhando, dia após dia, lutando contra algo que lhe tirava a seiva, a energia, a vitalidade.

Lembro do susto de um dia em que um galho pesado, carregado de erva-de-passarinho, caiu sobre um carro e quase atingiu uma senhora que entrava nele. Foi um milagre não ter acontecido uma tragédia, pois o peso maior ficou sustentado pelo teto do veículo. Mesmo assim, a resposta não veio. Era como se a vida daquela árvore, tão bela, tão útil, não tivesse valor algum.

Finalmente, um dia, a Prefeitura resolveu agir. Vieram técnicos, engenheiros, doutores de árvores, e com suas serras cortaram-lhe os galhos principais. A pobre acácia ficou quase nua, pelada, restando apenas um pequeno raminho verde insistindo em brotar do caule. Aquilo me deu esperança. Eu a reguei de novo, cuidei, torci para que se reerguesse. Mas a força da vida já estava comprometida. Pouco a pouco, o verde desapareceu e sobrou apenas o silêncio da madeira ressecada.

Hoje ela está morta. Estou triste. Uma árvore tão linda, que poderia ter vivido cinquenta, sessenta anos, foi reduzida a apenas trinta pela negligência humana. Mesmo assim, sua presença não é em vão. Seus galhos secos continuam servindo de poleiro para as aves, que ali pousam, cantam e descansam. Mesmo morta, ela ainda sustenta a vida. Não dá mais sombra, é verdade, mas dá abrigo — e isso já é muito.

Recordo-me de sua juventude: ela crescia rápido, abrindo galhos como braços estendidos, cobrindo-se de folhinhas miúdas. De tempos em tempos, flores e folhas se desprendiam e caiam ao chão, em um ciclo perfeito e previsível, como se obedecessem a um calendário secreto da natureza. Eu me alegrava com isso, porque via naquela cadência a beleza da criação.


Deus sabe fazer as coisas. Ele desenhou cada detalhe da vida daquela árvore. Mas a nós, homens, cabia o dever de preservar, de proteger, de colaborar com a obra divina. E nisso falhamos. Faltou-nos cuidado, zelo, responsabilidade. Hoje resta apenas a saudade e o arrependimento por não termos feito mais.

Apesar de tudo, quando olho pela janela, lá está ela. Mesmo morta, continua no mesmo posto de vigia, olhando para o meu quintal como sempre olhou. E eu, agradecido, continuo a olhar para ela. Há uma comunicação silenciosa entre nós. Parece me dizer que a vida passa, que tudo morre, mas que a memória e a beleza resistem.


Linda acácia. Meu coração se entristece porque sei que poderia ter durado mais, muito mais. Mas, ao mesmo tempo, sinto gratidão pelo tempo que partilhou conosco. A vida é assim: passageira, frágil, mas plena de sentido enquanto dura.

Olho para ela agora, imóvel, austera, e percebo que mesmo na morte permanece altiva, com uma dignidade silenciosa. Talvez a madeira resista ainda por muito tempo, firme, sem risco para ninguém, testemunha da nossa rua, da nossa história, da minha própria vida.


Minha árvore. Apenas uma árvore, dirão alguns. Mas para mim, era muito mais: companheira de tantos dias, guardiã de memórias, sombra de reflexões. Hoje não me oferece frescor, mas oferece lembrança. Não floresce, mas ensina. Não respira, mas me faz pensar no tempo, na vida, na morte e na responsabilidade que temos diante da criação.

Tudo passa, tudo morre, mas algumas presenças continuam. E assim será com a minha árvore: ainda morta, segue viva em mim.

 
 
 

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